Eu faço cinema, o cinema me faz.

O que podemos dizer sobre as produções audiovisuais brasileiras que estão por vir? Farão parte de novos ciclos bem delineados como foram a chanchada e o cinema novo na história do cinema brasileiro? Ou serão caracterizadas pela heterogeneidade, pelos múltiplos olhares de seus realizadores? Em uma aposta, optaríamos por esta última alternativa. Mas... Quem são esses novos realizadores do audiovisual brasileiro? O que eles pensam sobre o fazer cinema? Como isso se reflete nas suas realizações?

“Inventaria-te antes que os outros te transformem num mal-entendido.”
Glauber Rocha

Assistir video: Eu faço cinema, o cinema me faz.
*favor assistir o video clicando no link acima, por problemas técnicos ainda não foi possível incorporá-lo diretamente no blog.

Três jovens, protagonistas de projetos repletos de novidades, que fazem parte de uma nova geração de cineastas. Três mentes livres, movidas por uma paixão contagiante pelo fazer cinema. Um encantamento que, de tão puro, enche os olhos e dá água na boca. Vontade mesmo de saborear o que eles têm para oferecer.

Em comum, a relação com o cinema. Em cada um, diferentes inquietações que geram relacionamentos únicos, íntimos, refletidos em suas produções. Um cinema conversa, um cinema descoberta (e mesmo autodescoberta), um cinema amor.

Para Bruno, o fazer cinema proporciona ouvir verdadeiramente as pessoas, lidar com elas, conversar. Transitar entre vários mundos de forma rápida porém aprofundada. Construir e compartilhar realidades imaginadas como se voltasse a ser criança, com a diferença de poder criar com o mundo real. Parte do encantamento reside em congelar histórias, eternizá-las através do seu olhar, de seu ponto de vista.

Formado em jornalismo pela UNIFOR, tem especialização em Audiovisual em Meios Eletrônicos pela UFC. Montou neste ano a produtora Nigéria com um grupo de amigos com quem já trabalhava há cerca de três anos. Com trabalhos mais voltados para o gênero documentário, tem produções como “O Conto Torto do Olho” (2008), “Atlético Futebol Clube” (2009), “Fortaleza City” (2010) e o “Brincantes Fúnebres” (2011). Atualmente, está finalizando um documentário sobre agronegócio na chapada do Apodi, em Limoeiro. Em breve, iniciará um curta sobre os índios Tapebas através de edital da Secult.

O jornalismo surgiu como uma brecha para se aproximar do audiovisual. É aí que surge a ONG Aldeia, onde trabalhou durante cinco anos como voluntário no desenvolvimento de um projeto de educomunicação em audiovisual. Com o Grupo Trema, que une jornalismo e audiovisual, produziu seu primeiro vídeo a partir da conquista de um edital.

Com tantos projetos, essa relação cresceu a ponto de ter o cinema como a sua vida: seu trabalho, diversão, lazer, expressão, estudo… seu alicerce dentro do mundo real, como ele mesmo define.

Para Andressa, o importante no cinema é a descoberta de si, do outro e das emoções. É arte e tem de ser inquietante, reverberar nas pessoas. Gerar reflexão ao mesmo tempo em que traz novos elementos, questões provavelmente impensadas, desconhecidas. Mas é preciso se permitir a experimentar sensações, ir além do racional. Se deixar levar e sentir por sons e imagens, que às vezes podem parecer não fazer sentido, mas disparam outras sensações diferenciadas, que emocionam e elevam.

No fazer cinema, o processo é para ela mais importante do que o resultado final. É a chance de exercer diversas funções dentro de uma produção, exercitando assim a criação coletiva. Ainda mais porque cada obra tem sua especificidade, sua lógica particular. É a oportunidade de descobrir-se em situações distintas e de entrar em sintonia com as pessoas.

O cinema é sua paixão de infância. Sempre se sentiu mais atraída pelo outro lado da tela. Queria passar para as pessoas as emoções que sentia. Mas foi quando começou a estudá-lo que passou a achar que emocionar as pessoas não era mais uma questão central. Descobriu que não queria apenas fazer rir ou chorar, mas também produzir reflexão. Emocionar, sim, contanto que de forma variada, livre. Pois, para ela, a experiência do cinema se torna mais interessante quando o espectador se sente completando a obra, contribui à sua maneira, a interpreta de formas distintas.

Formada em jornalismo pela UFC, participou de curso intensivo de Realização pela Academia Internacional de Cinema em São Paulo e está concluindo o curso de Realização em Audiovisual da Vila das Artes. O documentário “Até Onze e Meia” (2009) foi produzido através de edital da Secult e surgiu da vontade de fazer um filme com os amigos. Todas as outras produções são encaradas por ela como exercícios, já que são frutos dos cursos realizados. Por assumir que está em processo de aprendizado, não considera ter realizado nenhum trabalho que a contemple como realizadora. Atualmente, está com a videoinstalação coletiva “Entre o que me merece e o que me faz feliz” ligada ao tema “Imagem e Espaço” (de acordo com o trabalho de ciclos adotado pela Vila das Artes) em exposição até o dia 16 de junho no Centro Cultural Banco do Nordeste.

Para Leonardo, o cinema é puramente amor. E é plural, dada a diversidade de influências, que vão do teatro e da performance às artes visuais. A importância da relação com o corpo é evidente, produzir narrativa a partir do gesto o seduz. O fazer cinema em si é um desejo que surge não de uma necessidade narrativa ou de simplesmente fazer imagens, mas de criar a partir delas, num exercício de imaginação. “O cinema lhe dá imagens e você tem que pensar em outras. O interessante no cinema é o invisível, é o que você não vê, é o que você sugere.”

Começou um curso de teatro em 2006 devido à vontade de fazer cinema, já que o curso não existia no Ceará, na época. Embora não o tenha concluído, é do teatro que aproveita boa parte do conhecimento que aplica no cinema. Também entrou no universo da dança, mas com outra contribuição, a do olhar cinematográfico aliado às artes visuais, área que cursava na época.

Estudante de Cinema e Audiovisual da UFC, possui apenas uma produção, o curta experimental “Fui à Guerra e Não te Chamei” (2010). Atualmente, está finalizando dois vídeos, dentre os quais a ficção “Dias em Cuba”, gravada com atores amigos durante as férias. Gosta de trabalhar com as mesmas pessoas, amigos de longa data, por já saber o que eles têm a oferecer e vice-versa, gerando uma troca produtiva. Além de proporcionar essa relação única com as pessoas, para ele o cinema é uma arte relativamente nova, que ainda tem muito potencial para se desenvolver. E isso também o motiva a continuar produzindo.

No seu processo criativo, ao tornar vivo um conjunto de imagens, sons e palavras, Leonardo é tomado por um alto nível de concentração, tanto no set como em todas as etapas do processo, criando uma atmosfera única de envolvimento. O que ele quer que as pessoas sintam com o seu trabalho, o que ele quer que transpasse os frames, é o amor que todos os que estiveram envolvidos sentiram no momento da sua produção. É fazer um filme com honestidade e deixá-la à mostra.

Esses três personagens compõem uma pequena amostra de novos realizadores do audiovisual brasileiro. Não dos que já encontram lugar na produção presente, mas dos que estão dando agora os primeiros passos nessa jornada incessante de amadurecimento do ver, ouvir e sentir. Numa inversão de papéis, colocamos esses autores em cena, contra a parede.

Eu sou, vejo, ouço, sinto, penso, faço, eu sou. Eu me transformo. Faço cinema e o cinema me faz ser quem eu sou. Se existem filmes capazes de mudar a vida de uma pessoa, o que dizer da mudança provocada em seus idealizadores? O pensar, o criar, o sentir, o dialogar. Tudo se renova e faz parte de um ciclo contínuo no processo de aprendizado e experimentação. Mais do que nos questionar sobre o que o cinema faz nelas, o que ele faz delas.

Como resultado: fragmentos de digressões que juntos procuram a essência do fazer cinema. Uma busca pretensiosa que moveu este trabalho menos pela intenção de encerrá-la do que pela vontade de apontar indícios de como isso irá se refletir no nosso cinema futuro.

Camila Sousa | Gabriela Ribeiro | Hercília Diniz | Tainara Carvalho
Agradecimentos: Andressa Back, Bruno Xavier e Leonardo Mouramateus.

Ensaios para disciplina Cinema e Pensamento de Cinema e Audiovisual da Universidade Federal do Ceará.